quinta-feira, 31 de julho de 2008

Com a venda nos olhos




“A alma generosa prosperará, e quem dá a beber será dessedentado..”
Pv. 11:25.


I
Da calçada alguém olhou a cena estático. Um homem de seus quarenta com um balde à mão retirando afoito água de um barco.
Tudo acontecia ali, ante os olhos curiosos de muitos transeuntes, que paravam em frente ao museu.
O barco estava dentro de uma piscina no centro daquele modesto Museu da história da Humanidade.
Havia, no fundo do barco, um orifício com tampa. Tirando a tampa, a água começava a entrar, quando já tinha água suficiente para encher dois ou três baldes o homem tampava o orifício, e punha-se a esvaziar o barco.
Assim ficou o dia todo.
Os funcionários do museu nada fizeram para impedir. A ninguém fazia mal. Talvez, descarregasse tensões da vida diária.
As portas se abriam e fechavam. Muitas pessoas adentravam os salões daquele edifício no centro da cidade.
O homem parecia cansado, mas não se dava por satisfeito.
Tampa. Água, tampa, balde, tampa.
Roupas molhadas, expressão de cansaço.
O barco se movendo sobre a piscina.
Todos se perguntando: O que faz este homem? Qual o seu objetivo? O que significa isso? Estará louco?
A tarde chegou e em seguida a noite. O homem foi expulso do Museu.
Luta de um dia inteiro. Em seus olhos um mistério. Em que pensava?
Balde à mão, foi descendo a rua principal. Chegou a uma casa pequena na periferia da cidade.
Um mato ralo e rasteiro cobria a frente da casa, que tinha um aspecto colonial. O portão rangeu ao ser aberto. Som de pássaros, som de veículos, início da noite.
Abriu a porta bem devagar. Estava exausto e com fome. Nada comeu. Deitou-se, dormiu.

II
Sonhou que um ser desconhecido e majestoso, dizia-lhe: “proponho-te um enigma: o que em vastidão cobre a terra, tem poder de vida e morte, mas nem por isso é um ser vivo, racional?” Veio-lhe ao pensamento “Será que estou vivo? O que vejo não parece racional”. E viu cenas de sua vida. E momentos de descontração. E alegria. E emoções intensa. E Uma voz lhe perguntou: “você nega que sentiu tudo isso? Então, por que em momentos de calamidade a vida te parece ruim? Você se ria nos bons momentos sem se preocupar com o mal que te poderia sobrevir.”
O ser traçava comentários acerca do imediatismo do homem e como só se importava com o agora. “O futuro não pode mudar as atitudes do presente. Uma pessoa se arrepende do passado, mas no agora não pensa que conseqüências terá suas ações. Não que não tenha consciência disso, antes porque busca o caminho mais fácil...”
E, ainda no sonho, um mar se abriu. E pessoas morriam afogadas. Ele nada podia fazer, e se frustou.
A seguir, viu-se em um deserto, sentiu sede.
Se surpreendeu ao ver água cristalina jorrar de uma pedra. O vislumbre se apossou de sua alma. Quando foi bebê-la se lembrou do enigma.
Rápido outra cena se sucedeu. Estava em um corredor e muitas portas se abriam.
Contemplava as belezas de tudo o que se encontrava do outro lado. Achava não estar pronto para entrar, e a porta se fechava. Daí a pouco outra porta se abria. O mesmo se repetia. Até que uma porta se abriu mostrando tortura e muita miséria. Ele se pôs a entrar. “Eu os vou ajuda a saírem dessa miséria.”
Obstruindo a porta não os deixava acessar a galeria, e isso os impedia de poderem escolher...
Não os pôde ajudar, o que precisavam estava naquele corredor.

III
A noite estava escura.
O vento fazia barulho ao passar pelos galhos secos de uma árvore próxima a janela. Convidava todos os seres vivos a se agasalharem e se refugiarem em suas casas.
Noite com promessa de frio.
Folhas caíam.
O silêncio só cedia ao som de insetos... corujas... cães.
O balde descansava, ainda molhado, abaixo de um quadro. Um caminho que morria entre as montanhas era a cena dele.
Sobre uma mesa um copo d’água, cheio até a metade.

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