sábado, 9 de agosto de 2008

O Monte Orgamunom




"No mais profundo abismo até as trevas são alguma coisa."
Helen Dummey


A tarde se acumulava de gente. A cidade era pequena, mas cabiam as conversas, os trabalhos, as tragédias, e o ócio... Os prédios se decretavam eternos, sem se disporem a conhecer que nada é sagrado para os homens. A atividade das gentes trazia risos, carinhos, preocupações, abalos, confortos, mesmice, descobertas...
O mundo das palavras, conta uma lenda, brigou com o mundo do real e deste se afastou. Foi que do muito não-contato desapareceu dos livros o verídico. Nem tudo podia ser transposto para o papel. Agora o real era lembrança de uma passada união. Posto que isso se deu o tempo e o lugar se apegaram as palavras e festaram um dia, dois, três... que hoje ainda se vê.
Trabalhava Alair em um jardim. E as idéias o atacavam sem piedade. Percebia, sem aviso, que o um mundo era um grande-tudo-de-uma-única-coisa. Tudo tinha um princípio básico, que pelo muito se repetir dava o efeito de diferente. Cerca viva, era um conjunto de ramas e folhas. De acordo com o corte se ia tomando forma e resultava de algo qualquer-coisa-outra.
Como podia ser isso? Em contrafeita, a vida é curta para se buscar uma tal resposta. Curta a vida, não o mundo. Pelos jornais, revistas, e outros meios de comunicação se estabelecia um dilema na cabeça do jardineiro: o mundo é grande ou pequeno? É grande, tem muita gente, casas terras. Como? Se podemos dar a volta em todo ele a poucas horas. Não, é pequeno. Se é assim por quê demoro tanto tempo de casa até o trabalho? É grande. Tem tanta coisa nele.
E não cabia o mundo em um minuto de pensamento. Tal que o filodiano se desesperou em muitos subsequentes dias. Queria todas as coisas na mente. E não achava de tê-las, por questão de ordem. Começou a se disciplinar. Pensaria em algo diferente a cada momento. Não pôde. Vai vê o mundo é pequeno mesmo. Vou me concentrar. Encontrando-se em sua chácara subiu em um monte, ponto mais alto. Fixou o olhar no horizonte. Se cansou de contemplá-lo, apesar de não ser, este, o mesmo a cada segundo. O mundo era de uma tal forma o mesmo e diferente que o espantou. Teve medo de tudo. E se ele fosse único no mundo? Olhou as flores no cerrado. Não pensavam, não sentiam, não doía para elas. Doía para ele. Se sentia só, num universo cheio. Cheio, mas vazio. Vazio do quê? E eram as árvores, os pássaros... Pensou: o que preciso é de um espaço menor, assim não me distrai-o. Tudo parecia ser muito, nada era simples. Pegou uma pedra. Essa é simples. Não era. Descobriu formas, texturas, cores... a pedra era um universo gigantesco, não cabia no querer pensar. Fechou os olhos. A escuridão é simples. Vazio, vazio, vazio... Não agüentava mais. O mundo era o vazio de muitos tudo. Os pensamentos forçavam passagem, insistiam, não aceitavam-se desprezados. Começou a prestar atenção à respiração. Foi sentindo falta de ar, desconforto... parou.
O mundo era demais para ele, mesmo que coubesse na palma da mão. Tudo era tão simples que podia ser dito. Daí as estórias. No entanto existiam livros e livros, e todo assunto ocupava horas na vida das pessoas sem se fechar totalmente. Como pode o mundo ser tão simples e complexo, compreensivo e avesso à lógica.
A pessoa que vai realmente volta ou a vida é um constante ir? O tempo está passando ou é o mesmo eternamente? Se ontem é o hoje de amanhã, então o tempo é um sempre eterno? Há muitas razões para se fazer algo, e tantas outras mais para não se fazer. Não pode portanto existir uma maneira única de se agir. Como então o homem vai se orientar? Se é possível cercar todas as decisões usando de um princípio básico qual é ele? O que o homem deve buscar ter na vida?
Em sua mente pulsava que: a vida é um tribunal. Há quem acuse, quem defenda e um que julga tendo o poder de decidir. A parte que for mais convincente domina.
Foi surpreendido então por um sentimento. Não ser apoiado. Impotente diante de algo opressivo, opressivo com não poder escolher. Veio que, as pessoas se unem por necessidade, não existindo esta, percebe-se os outros se afastando. Não é somente uma solidão. É o esquecimento de ser, do qual só participam os que têm consciência da própria existência.
Logo lhe surgiu que na verdade somos mercenários. Negociamos tudo. Constantemente estamos fazendo acordos uns com os outros, e até com Deus. A vida é isso: enquanto tivermos algo para trocar/dar/vender estaremos vivos, quando não mais tivermos, hei-nos na sepultura. A história é a prova disso. Os homens que são dados, pela história, como grandes, não passaram de peritos negociantes que um dia não puderam mais barganhar.
Tudo girava em torno de um centro. Por mais que as idéias fossem se distanciando umas das outras, logo encontravam um ponto de convergência. O ponto central tornava sem sentido toda a especulação e deixava uma sensação de estar perdendo tempo com pensamentos infantis, insipientes.
As pessoas não refletiam sobre o sentido da vida. Elas viviam cada momento, viam apenas parte do quebra-cabeças, não faziam idéia de como era ele todo. Não sabiam o mundo do real.
Também se buscassem saber, a vida ficaria sem sentido? As formigas são exemplo disso: todos trabalham para continuarem vivos, mas vivos para continuarem a trabalhar?
Ninguém sabe ao amanhecer o que será o dia, o quê há de acontecer, nem sequer para o fim de refletir.
No jogo de ganhar ou perder: quem perde se deixa desanimar, mesmo que por pouco tempo; quem ganhar alimenta uma falsa idéia de bem estar, mas tudo que se ganha não será mantido. A dimensão do tempo, magoa e cura, distorce e conserta, tira, toma e traz de volta.
O mais certo é o poder da palavra. Uma palavra pode originar ou encerrar enormes discursos.

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